Depressão: quadro clínico

Aspectos gerais da Depressão

A depressão e suas formas (transtorno depressivo maior, transtorno depressivo recorrente, transtorno depressivo persistente, entre outros) é uma condição médica que vai além da tristeza cotidiana. Ela pode causar sintomas graves e duradouros, e muitas vezes interfere nas atividades diárias habituais (perda de funcionalidade). A predisposição pessoal para desenvolver esse transtorno muitas vezes está relacionada a vários fatores, incluindo mudanças na função cerebral, genética, características psicológicas, estresses e circunstâncias da vida.

A depressão é o transtorno psiquiátrico mais comum em todo o mundo. Nos Estados Unidos, quase 20% da população experimenta um episódio de depressão em algum momento de suas vidas. Mesmo assim, muitas pessoas que têm o transtorno não discutem seus sintomas com um profissional de saúde. Em vez disso, 2/3 das pessoas com depressão que procuram um profissional de saúde para cuidados de rotina chegam reclamando de outros sintomas, como dor de cabeça, problemas de sono ou dor crônica.

As pessoas podem relutar em discutir seus sintomas de depressão por várias razões. Muitas vezes, elas se preocupam com o estigma da doença mental; às vezes, preocupam-se que um médico clínico geral ou de outra especialidade (cardiologista, ginecologista, etc) não seja o profissional de saúde apropriado para perguntar; algumas veem sua condição como uma “fraqueza pessoal” em vez de uma “doença real”; e algumas se preocupam com as implicações de ter uma doença psiquiátrica registrada em seu histórico de saúde ou profissional. No entanto, existem tratamentos eficazes, e não tratar a depressão pode levar a problemas ainda mais graves.

Pessoas com depressão não tratada têm uma qualidade de vida inferior, um maior risco de suicídio e prognósticos piores se tiverem alguma condição médica junto com a depressão. Na verdade, pessoas com depressão têm quase o dobro de chances de morrer em comparação com pessoas sem depressão, principalmente devido a outras condições médicas. Além disso, a depressão afeta não apenas a pessoa com o transtorno, mas também as pessoas ao seu redor.

Este artigo fala sobre as características clínicas e o diagnóstico da depressão em adultos. O tratamento para diferentes formas de depressão pode variar dependendo dos sintomas e da situação da pessoa. Tenho outro artigo onde falo sobre os tratamentos disponíveis.

Sintomas da Depressão

A depressão pode assumir várias formas e apresentar diferentes níveis de gravidade. Parte da variabilidade no transtorno ocorre porque ele pode coexistir com muitos outros transtornos mentais (como transtornos de ansiedade ou transtornos do uso de substâncias/dependência química), o que modifica também os sintomas da depressão.

Critérios diagnósticos — Quando as pessoas falam sobre a chamada “depressão clínica”, ou “episódio depressivo”, geralmente estão se referindo ao que os profissionais de saúde chamam de Transtorno Depressivo Maior (TDM). Para ser diagnosticado com TDM, uma pessoa deve ter cinco ou mais dos seguintes sintomas presentes na maioria do dia, quase todos os dias, por pelo menos duas semanas consecutivas. Para o diagnóstico, pelo menos um sintoma deve ser ou humor deprimido ou perda de interesse ou prazer:

  • Humor deprimido: Pessoas com depressão tendem a se sentir tristes, sem esperança, desanimadas, “pra baixo” ou “no fundo do poço”. Às vezes, elas descrevem isso como se sentissem “vazias” ou sem sentimentos. Além disso, algumas pessoas com depressão sentem ansiedade, irritação, frustração ou raiva em excesso.
  • Perda de interesse ou prazer na maioria ou em todas as atividades: Pessoas com depressão podem não ter mais tanto interesse ou prazer nas coisas que costumavam gostar. O termo médico para isso é anedonia. Hobbies e atividades “perdem a graça”, e as pessoas deprimidas dizem que “não se importam mais”. Elas podem se afastar ou perder o interesse em amigos, atividades sociais ou hobbies.
  • Alteração no apetite ou peso: O apetite e o peso podem diminuir ou aumentar como parte da depressão. Algumas pessoas precisam se forçar a comer, enquanto outras comem mais e às vezes têm avidez (“desejo”) por alimentos específicos (como fast food e carboidratos). Algumas pessoas com depressão grave podem ganhar ou perder tanto peso que têm problemas de saúde relacionados a isso.
  • Insônia ou hipersonia (dormir muito pouco ou dormir demais): A depressão muitas vezes interfere nos padrões de sono, levando as pessoas a dormir demais ou a não conseguir adormecer ou permanecer dormindo. Mesmo quando dormem, as pessoas com depressão frequentemente dizem que não se sentem descansadas e têm dificuldade em sair da cama de manhã.
  • Agitação psicomotora ou retardo psicomotor (inquietação ou lentidão): Pessoas com depressão podem se sentir agitadas e inquietas, ou ter o efeito oposto e se sentirem mais lentas. A agitação pode se manifestar como torcer as mãos, balançar as pernas ou mexer-se muito, enquanto o retardo pode se manifestar como uma redução dos movimentos corporais ou uma sensação de pensamento ou fala mais lentos.
  • Fadiga ou perda de energia: Pessoas com depressão frequentemente se sentem exaustas e apáticas. Às vezes, elas precisam descansar durante o dia ou até sentem que os braços e as pernas estão pesados. Muitas têm dificuldade em começar ou concluir tarefas.
  • Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva: Pessoas com depressão podem se sentir inadequadas, inferiores, sem valor ou como um fracasso. Muitas vezes, elas carregam uma culpa tremenda por coisas que podem ter feito ou não feito. Frequentemente, isso as leva a interpretar eventos neutros ou pequenos contratempos como evidência de falhas pessoais.
  • Dificuldade de concentração: Algumas pessoas com depressão têm dificuldade em pensar com clareza, concentrar-se ou tomar decisões. Elas também podem ser facilmente distraídas ou reclamar de problemas de memória.
  • Pensamentos recorrentes de morte ou suicídio: Pessoas que estão deprimidas podem ter pensamentos recorrentes de morte ou suicídio, e podem tentar o suicídio. Os pensamentos de morte ou suicídio, chamados de “ideação suicida”, podem ser passivos, o que significa que a pessoa pensa simplesmente que a vida não vale a pena viver. A ideação suicida também pode ser ativa, o que significa que a pessoa deseja ativamente morrer ou se matar. Pessoas com qualquer forma de ideação suicida precisam de atenção médica imediata – não espere! Procure ajuda psiquiátrica o quanto antes.

Algumas pessoas têm planos específicos de suicídio ou começam a fazer preparativos. Os preparativos podem ser, por exemplo, escolher um momento e um lugar para o suicídio ou comprar um estoque de medicamentos letais ou uma arma.

A tendência suicida piora quando as pessoas se sentem sem esperança e veem o suicídio como a única saída de uma dor emocional intensa e interminável.

Algumas pessoas com depressão se machucam, por exemplo, superficialmente cortando ou queimando a pele (automutilação).

Outros sintomas da depressão podem incluir ansiedade, desesperança e pensamentos ruminativos (tendência a fixar-se nos mesmos pensamentos negativos).

Subtipos de depressão — O Transtorno Depressivo Maior pode ter diversas características mais específicas, de acordo com o perfil de sintomas. Exemplos incluem:

  • Depressão com características mistas: Este é o termo para a depressão que é acompanhada por alguns sintomas maníacos (ou “eufóricos”), mas não o suficiente para diagnosticar uma pessoa com Transtorno Bipolar. Uma pessoa com esse tipo de depressão pode fazer coisas como falar muito mais do que o normal, ter energia extra, dormir menos ou ter episódios de parecer excepcionalmente feliz ou excitada.
  • Depressão ansiosa: Os sintomas mais proeminentes da depressão ansiosa incluem preocupação, agitação e outras manifestações de ansiedade.
  • Formas de depressão específicas da situação: Por exemplo, às vezes as mulheres desenvolvem depressão logo antes ou depois do parto, chamada “início periparto”, ou ciclicamente, logo antes da menstruação, chamada “transtorno disfórico pré-menstrual”.
  • Transtorno afetivo sazonal: Esta é uma forma de depressão que surge e desaparece em determinadas épocas do ano. A forma mais comum dessa depressão é de começar no final do outono e desaparecer na primavera e no verão.

Como posso obter ajuda?

Se você acha que pode estar com depressão, procure um médico psiquiatra. Ele vai conversar com você sobre seus sintomas, fazer perguntas e discutir as opções de tratamento com você.

Se você acha que seu parceiro ou familiar pode estar com depressão, ou se está preocupado que ele possa se machucar, busque ajuda imediatamente.

Depressão e Comorbidades

Quando uma pessoa tem duas ou mais condições médicas, essas condições que ocorrem juntas são chamadas de comorbidades. A depressão pode ocorrer por si só, mas muitas vezes ocorre junto com outros transtornos psiquiátricos ou médicos. Na verdade, ter outro transtorno psiquiátrico ou médico aumenta o risco de desenvolver depressão. Dizemos que os transtornos mentais “andam de mãos dadas”.

  • Psiquiátricos — Entre os transtornos psiquiátricos que podem ocorrer junto com a depressão estão transtornos de ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtornos do uso de substâncias (álcool e drogas) e outros. Também é possível ter depressão junto com um transtorno de personalidade, como o transtorno de personalidade evitativa ou borderline.
  • Médicos — A depressão pode ocorrer junto com outros problemas médicos, como diabetes, pressão alta, doenças cardíacas, câncer e muitos outros. A relação entre a depressão e as comorbidades médicas é complexa. A depressão pode piorar diante de problemas médicos e, ao mesmo tempo, causar o agravamento das próprias condições médicas. Em parte, isso ocorre porque a depressão torna difícil para as pessoas cuidarem de suas condições clínicas.

Diagnóstico da Depressão

Se o médico psiquiatra suspeitar que você tem depressão, ele ou ela perguntará sobre seus sintomas e estado de ânimo. As informações mais importantes virão da sua descrição do que está sentindo.

Durante a consulta, o profissional de saúde irá:

  • Notar e observar quais sinais de depressão você apresenta.
  • Determinar quando seus sintomas começaram e se eles já aconteceram antes (e, se sim, como eles progrediram).
  • Avaliar como seus sintomas estão afetando sua vida cotidiana e relacionamentos.
  • Perguntar sobre fatores que podem estar piorando ou melhorando seus sintomas (como eventos estressantes na vida ou uma perda).
  • Perguntar se algum membro da sua família tem histórico de depressão, suicídio, transtorno bipolar ou outras formas de doença mental.
  • Discutir quaisquer outras condições psiquiátricas ou médicas gerais que você possa ter (como um transtorno de ansiedade ou uso de substâncias, ou doença física), e explorar se algum dos medicamentos que você toma pode estar contribuindo para seus sintomas.
  • Verificar se você já teve sintomas do que os profissionais de saúde chamam de “mania”, que é quando você se sente feliz, energético, impulsivo, frenético e grandioso (esses podem ser sinais de outra condição psiquiátrica chamada transtorno bipolar – abordo essa condição em outro artigo).
  • Risco de suicídio — Como parte da sua avaliação, o psiquiatra precisará determinar se você está em risco de suicídio. Ele vai perguntar se você tem pensamentos de morte ou suicídio e, se tiver, se esses pensamentos incluem algum plano ou ação específicos.

Dependendo dos pensamentos e sentimentos, o psiquiatra pode decidir simplesmente acompanhar o seu progresso, ou – se estiver muito preocupado com o risco de suicídio – encaminhá-lo para um pronto-atendimento local.

Os pensamentos suicidas que fazem parte da depressão podem melhorar com o tratamento, assim como outros sintomas da depressão. Isso torna ainda mais importante procurar um profissional de saúde, porque a morte ou lesão devido a tentativas de suicídio na depressão pode ser prevenida com o tratamento adequado.

Exame físico — Se seus sintomas são novos ou não têm precipitante aparente, ou se não melhoram com o tratamento, é possível que você precise de exames de laboratório ou outros tipos de testes para verificar desequilíbrios hormonais ou outras condições médicas possíveis que possam causar sintomas depressivos.

Fatores de risco para Depressão

A depressão ocorre com mais frequência em pessoas com certos fatores de risco ou características. Estes incluem:

  • História pessoal ou familiar de depressão.
  • Tendências psicológicas de se preocupar com coisas de maneira exagerada, ou de ver as coisas de forma negativa.
  • Baixa autoestima.
  • Transtorno de ansiedade.
  • Uso indevido de substâncias (como uso de drogas).
  • Trauma durante a infância ou vida adulta.
  • Eventos estressantes na vida no último ano.
  • Perda dos pais ou outras circunstâncias estressantes na infância.
  • História de divórcio ou problemas matrimoniais ou de relacionamento.

Alterações neurobiológicas na Depressão

Os cérebros das pessoas com depressão mostram diferenças significativas em relação aos cérebros das pessoas sem depressão no número e tamanho de certos tipos de células cerebrais, nas substâncias químicas (chamadas neurotransmissores) que as células cerebrais usam para se comunicar entre si, e no tamanho de certas estruturas cerebrais. Não está claro, no entanto, se essas diferenças induzem a depressão ou se estar deprimido causa essas mudanças. Ainda assim, não existem exames complementares que faça o diagnóstico de depressão; somente a entrevista clínica realizada durante a consulta psiquiátrica.

Tratamento

Se você for diagnosticado com depressão, seu profissional de saúde irá informar que tipo de depressão você tem e quais tratamentos podem funcionar para você. Frequentemente, o tratamento envolve psicoterapia, medicamentos antidepressivos ou uma combinação dos dois. O tratamento da depressão é discutido em outro artigo.

Compartilhe!